terça-feira, 14 de abril de 2020

A cidade de Ashtray, no Estado de Wisconsin poderia entrar para os noticiários por vários motivos em 2018. Um incêndio havia acabado de destruir uma área com mais de 60km² de madeira de reflorestamento, levando junto as expectativas de transformar as antigas instalações da ferrovia em algo lucrativo. A cidade também não ficou famosa, mesmo tendo sido esquecida na última contagem de municípios, o fato de ter perdido mais de 50% de sua população desde 2013, o fechamento de indústrias e a explosão da violência em um período relativamente próspero para o resto do país também não parecia chamar a atenção das pessoas. 138.446 pessoas viviam na cidade às 20:30 horas do dia 13 de junho de 2018. Era uma noite de lua nova, com céu claro, apesar do clima normalmente frio, os últimos raios de Sol ainda insistiam em contemplar o trabalho feito em deixar a cidade agradavelmente aquecida.
Joesnne McArty, uma enfermeira de 25 anos, divorciada, com uma filha, duas prestações da hipoteca atrasadas sentia-se meio ridícula em seu velho maiô de natação. Tentava conformar-se com o fato de poucas pessoas ainda caberem nas roupas que usavam no ensino médio. A lembrança de ser chamada de “Josie Gorda” não a fez sentir-se melhor. Mas ela era boa em natação. Sentia-se bem na piscina, e, após a audiência de conciliação e dois plantões exaustivos, precisava fazer algo por si mesma. Há um motivo para que os habitantes de Ashtray saibam de todos esses detalhes. E é estranho que o resto do mundo não.
Joesnne acabara de sair da piscina coberta do clube parcialmente vazio, quando um assaltante invadiu o local, em intensa troca de tiros com policiais. Um helicóptero havia sido acionado. O meliante tinha uma submetralhadora Uzzi e, por algum motivo, uma Barret REC7. Não sobrou uma única bala em seus pentes. Os policiais esvaziaram os pentes de suas pistolas 9mm, mas, tanto policiais quanto assaltante morreram com a queda do helicóptero sobre a piscina. A enfermeira nada sofreu. Estudos médicos posteriores revelaram que a estrutura molecular de sua pele tornava-se extremamente rígida caso ela estivesse nua ou usando roupas que considerava vergonhosas, mas retornava ao normal quando ela não sentia esse desconforto, embora a causa desse fenômeno permaneça desconhecida. Joesnne foi esfaqueada na saída de um caixa eletrônico em 2019. O nome e destino de sua filha permanecem incógnitos.
A história de Joesnne repercutiu pela cidade. Atualmente, há um temor especial com relação a criminosos que abordem suas vítimas usando trajes de banho, uniformes de “lucha libre”, ou fantasias das mais variadas. Alguns fazem isso para que acreditem que são à prova de balas. Outros, mais perigosos, agem como se eles mesmos se considerassem à prova de balas. A polícia tenta acalmar a população, demonstrando que a maioria não é, mas falhas de pontaria só deixaram as pessoas mais apavoradas.
Às 13:42 de 04 de Fevereiro de 2020 aconteceu novamente. Harold D. S. Blackman, um ex-combatente da guerra do Golfo faleceu vítima de um ataque cardíaco. Sua herança, que consistia em uma pequena loja de bugingangas, um Cadillac Eldorado 1997 e três cadelas que ele alegava serem de raça pura, embora não especificasse qual, além de um enorme estoque de garrafas de uísque e comprimidos antipsicóticos, foram distribuídos de forma semi-igualitária entre seu irmão, um funcionário da loja e o abrigo de animais local antes de sua cremação.
Ao baixar-se a porta do forno, seu caixão, roupas, e uma história em quadrinhos alegadamente autografada por Mark Hamill foram vistos pela última vez. Harold, entretanto, seria avistado por diversas testemunhas correndo nu pelas ruas da cidade entre 17:27 e 19:02 do dia 06 de Fevereiro, fazendo o caminho entre as congelantes margens do Lago Verde, onde suas cinzas foram deixadas, e sua loja. Um cadáver com suas feições e impressões digitais deu entrada como indigente, vítima de quatro balas perdidas às 22:00 do mesmo dia. Seus órgãos foram doados e o restante enterrado em vala comum. Segundo seu irmão, de uma vez por todas.
Um vírus potencialmente letal varre o território americano nesse momento. As fronteiras intermunicipais estão vigiadas. Embora não exista nenhum caso da infecção na cidade, é impossível entrar ou sair da cidade sem uma comprovação documental da necessidade do deslocamento. O prefeito impôs toque de recolher, mas não foi obedecido.